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domingo, 6 de fevereiro de 2011

O fim da Cracolândia?


O projeto Nova Luz da prefeitura de São Paulo promete revitalizar a área da conhecida “Cracolândia”, na zona central da capital paulista. Segundo o governo, a proposta servirá para a valorização dos prédios históricos, reforma de áreas públicas e criação de espaços verdes e de lazer. Apesar das afirmações e das promessas, o projeto vem causando polêmica, principalmente entre comerciantes e moradores pobres da região, que temem ser despejados.

O que mais preocupa a Associação dos Comerciantes do Bairro da Santa Ifigênia (Asci) são as possíveis desapropriações previstas para a região, baseadas na lei municipal 14.917/09, que trata sobre a concessão urbanística da cidade. “Nossa questão principal nem é contra o projeto em si. O que nós não concordamos é com um processo que só visa o lucro de um grande grupo imobiliário”, afirma Paulo Garcia, presidente da associação.

A polêmica lei foi criada pelo prefeito Gilberto Kassab, em 2009, para orientar as intervenções urbanas que exigem grandes investimentos.

Caso os comerciantes não consigam alterar a legislação, serão expulsos da
área, afirma o representante.

Luis Ramos, chefe da Assessoria Técnica de Planejamento Urbano da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU), explica que o número de imóveis que será atingido pela “intervenção” do projeto é muito pequeno e que ainda é cedo para se falar em desapropriações. De acordo com ele, consórcio e prefeitura estão estudando mecanismos para evitar conflitos com os comerciantes. “Para as áreas que sofrerão intervenções, o primeiro caminho que a lei aponta é a negociação. Quem tem um imóvel na área poderá negociar uma troca no mesmo local ou em outro. As pessoas também poderão optar em fazer a venda. Só em última instância chegaremos à desapropriação”, afirma.

O Projeto Nova Luz tem cerca de 500 mil metros quadrados, uma área demarcada pelas avenidas Cásper Líbero, Ipiranga, São João, Duque de Caxias e rua Mauá. Abrange a revitalização de 45 quadras, das quais 12 serão demolidas. A inspiração para a revitalização vem de iniciativas urbanas realizadas em cidades como Barcelona (Espanha) e Nova York (Estados Unidos).

Outro ponto polêmico do projeto é a possível tentativa de “limpeza” social, ou seja, a eliminação da população pobre moradora da região para atender somente a interesses imobiliários. “A ideia da expulsão não corresponde à forma na qual o projeto está sendo encaminhado”, garante Ramos. Para Amélia Reynaldo, coordenadora do plano de urbanização da Zona Especial de Interesse Social (Zeis) do consórcio responsável pelo projeto, “a população pobre tem direito ao centro da cidade e isso não será diferente na Nova Luz”.
Para garantir moradia de baixa renda, o projeto possui áreas residenciais voltadas para isso: as Zeis, onde estão previstos 2.590 imóveis. E, segundo a prefeitura, a prioridade será das famílias que já moram no local. “Criar condições dignas de habitação para a população de baixa renda não é um favor nem do poder público nem do Projeto Nova Luz. A população moradora do local é um dado do projeto e faz parte da identidade da região”, afirma Amélia. “Outra possibilidade nunca esteve em discussão”, completa Ramos.

O representante do Movimento de Moradia Região Centro, Nelson Cruz da Souza, é contrário ao projeto. “Faz parte da operação higienista de acabar com os pobres no centro de São Paulo”, afirma.

Na opinião do professor Clovis Ultramari, doutor em Gestão Urbana pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), é essencial que grandes obras urbanas tenham preocupação social. Ele explica que a mistura de classes é importante para o desenvolvimento das cidades. “A existência das Zeis garante a responsabilidade do projeto com os mais pobres”, afirma.

Segundo Ultramari, há poucos anos dificilmente essas comunidades seriam mantidas num projeto do porte do Nova Luz. Exemplo de ação no Brasil que deu certo é a do Recife Antigo, na capital pernambucana, que elevou a qualidade do patrimônio histórico degradado por anos de políticas públicas mal sucedidas.

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